domingo, 27 de setembro de 2009

percebi que tudo que escrevo acaba indo pro mesmo lugar. to achando ruim.
em breve dou uma postada de novo, deixa baixar a inspiracao. beijos

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Isabela

Cruzei a rua e a vi observando sua própria imagem refletida nos vidros de um carro qualquer. Ela usava blush vermelho nas bochechas, uma provável tentativa de se sentir mais mulher. Tinha mudado a blusa e o sapato era velho mas tinha um certo charme. Pra ela. As pessoas que viam aquela mulher ali, apreciando uma imagem que não era a sua habitual, pensavam na loucura. Ela não. Pensava na beleza. Na mudança.
Nosso primeiro encontro havia acontecido há alguns dias atrás. Um amigo meu apontou pra ela, olha que estranha, disse, é famosa aqui na rua. Ela tinha cabelos longos e usava uma pantufa nos pés, como alguém que saiu de casa pra ir na padaria ao lado e esqueceu de pôr os sapatos. Observei de longe que ela pedia alguma coisa pra todas as pessoas que cruzavam por ela na calçada. Meu amigo disse que pedia cigarros. Ela desapareceu junto com o início da noite e eu fui pra casa sem pensar nela. Na semana seguinte a vi de novo. Estava perto de mim enquanto eu saía da padaria com um maço de cigarros recém comprado no bolso. Ela veio em minha direção e pediu um cigarro. Eu disse que não tinha. O maço no meu bolso pesou mais que o habitual, talvez um reflexo da minha consciência mentirosa. Ela saiu e foi procurar outra pessoa que pudesse alimentar seu vício. Eu havia sido descartado. Percebi que conseguiu um cigarro de um homem qualquer, mas não fumou. Guardou em sua bolsa e continuou na batalha por mais alguns. Até que a perdi de vista.
Os dias foram passando e eu pensava nela às vezes. Imaginava onde morava, como era sua vida, se tinha família, um cachorro, amigos ou qualquer pessoa que pudesse compreender suas vontades. Imaginei ela chegando em casa e derramando um punhado de cigarros em cima de uma mesa suja, um sorriso no rosto festejando o sucesso do dia. Ela tirava as pantufas dos pés, pegava uma caixa de fósforos e começava a se divertir com seus prováveis únicos companheiros noturnos. Depois de treze ou quatorze cigarros apodrecendo no cinzeiro, ela dormia pra acordar disposta no dia seguinte e continuar sua corrida. Completamente nova, feliz, objetiva. Não lhe faltavam certezas, ela era aquilo e aquilo era seu mundo.
Segunda-feira, oito horas da manhã, saí de casa correndo e vi ela lá, pedindo, por favor, um cigarro. Passei reto, com um maço fechado no bolso, do outro lado da rua, fingindo que não conhecia, fingindo que não fazia diferença. Ela ficou na minha cabeça pelo resto do dia. Sempre que eu ia acender um cigarro pensava naquela figura que não era humana, que não era mulher, que não era nada. Que me intrigava e que me fazia compreender qualquer busca por objetivo que fazia falta dentro de mim. Ela precisava só de cigarros, eu precisava de tudo e mesmo assim não me sentia completo. Eu deveria era me tornar um andarilho, entrar para o clã dela, andar por aí mendigando um pedaço de satisfação que pudesse preencher meus dias, minhas noites, meus espaços. Ela tinha tudo isso, ela usava pantufas e roupas ridículas, ela era ridícula, mas mesmo assim parecia feliz, mais completa a cada cigarro enquanto eu perambulava pelos corredores de uma empresa exploradora, sorrindo pra pessoas que desgostava, sem saber onde encontrar meu fim.
No dia em que a vi se encarando no vidro do carro pensei em abortá-la, pedir a ela que me ensine, que me acorde, que me diga onde consegue achar tudo que eu não consigo encontrar. Pedir que me mostre como pode enganar sua solidão com apenas alguns cigarros vagabundos. Eu queria. Queria mesmo, sabe. Quando tinha treze anos ganhei um computador. Fiquei feliz nas primeiras horas, depois disso veio o tédio, o conforto, a chatice, já queria mais e quando tinha, continuava querendo. Quero ser simples. Quero querer o simples. Botar na fogueira toda essa high tech, esse entretenimento barato, essa porra de quadrado eletrônico que eu nem sei pra quê serve, rasgar minhas roupas, arrancar meus cabelos, colocar fogo na imagem que eu criei pra me proteger. Comecei a caminhar em direção a ela, que continuava contemplando a mulher que já não lembrava mais existir, orgulhando-se de ter abandonado as pantufas e encontrado uma vaidade desconhecida. Meus passos foram ganhando velocidade enquanto ela continuava ali, imóvel, abismada, hipnotizada na frente do reflexo no vidro do carro, trancada como narciso dentro de si próprio, eu não queria perdê-la, acelerei os passos e parei diante dela, ofegante. Ela nem me olhou. Eu tirei do bolso um maço de cigarros que tinha comprado na noite passada. Ela olhou pra minha mão estendida e me encarou nos olhos, voltando a focar no maço em cima da minha palma aberta. Eu lhe lancei um olhar de generosidade e aproximei minha mão da mão dela, sem falar nada, um momento que não precisava de mais nenhum barulho a não ser o silêncio gritante que pairava ao redor. Sua mão foi vindo em direção à minha, o meu coração palpitando mais forte e a testa começando a suar. Ela hesitou. Recuou. Desistiu, não sei, talvez já havia desacreditado na generosidade humana. Pega logo, eu pensava. Ela ficou imóvel. Alguém saiu da padaria ali perto e chamou por Isabela. Ela virou rápido e um homem de terno surrado e chapéu cinza a observava, com uma sacola de plástico na mão recheada de pães. Chamou de novo. Ela olhou pro maço de cigarros ainda estendido na minha mão, abriu seus lábios e projetou sua voz para que eu pudesse escutar um não, obrigado. A mulher saiu caminhando desajeitada naqueles sapatos velhos e deu a mão esquerda para o homem do chapéu, lançou um último olhar de pena para mim e seguiu caminhando com ele, os dois estranhos assim, completos, únicos, preenchidos. A piedade dela entrou como uma lança quente no meu coração frio. Doeu. Fiquei pelo menos cinco minutos parado ali, imóvel, sozinho, triste. Sentei no cordão da calçada, abri o maço de cigarros que ela havia recusado, risquei um fósforo e comecei a fumar. Isabela. Não sei quanto tempo fiquei ali. Levantei a cabeça que estava encostada nos joelhos dobrados e vi o maço vazio, jogado no chão. Decidi ir embora pra casa. Derrotado. Vazio como o maço. Precisando acordar em um novo dia pra poder encher ele de novo, ser mais novo, mais humano. Preenchido como havia conseguido ser Isabela.

*essa mulher realmente existe, vive perambulando pela minha rua à procura de cigarros. eu sempre neguei. sei lá, medo, pena, egoísmo. ela ainda não trocou as roupas e nem passou blush nas bochechas. eu nem sei seu nome. mas ela me intriga.

domingo, 20 de setembro de 2009

Ponto

Me sinto velho demais pra falar das coisas novas, não enxergo o futuro que está diante dos olhos das minhas crianças de dentro. Não me vê? Não me acha? Eu sei, é difícil. Dignidade não existe. Não me cobra o controle sobre um poder que nunca experimentei, por favor, eu nunca quis ser corrupto a ponto de decepcionar todo mundo. Não quero. Não me força a conseguir qualquer coisa, qualquer um, qualquer encontro, farsa, saber, exigência. Não exige muito de mim porque eu não posso te pagar. Não me sobra mais muito. Não me quero mais direito. Quero errado, disconexo, perplexo. Chega de sabotagem: a partir de agora eu só quero não saber mais de nada, quero ser um porco ignorante pronto pra fazer contente tudo o que me mandarem e ponto, pronto.

quinta-feira, 17 de setembro de 2009

Semana

Só mais um dia. E as coisas melhoram. Só mais um dia pra tentar enlouquecer diante de todo conhecimento gerador da consciência humana. Só mais um dia de caos, de patifaria, de tirania, agonia. Ansiedade. Espero pelo dia. Minha cabeça gira em torno de um propósito estilhaçado e espatifado em um chão qualquer. Também quero uma nova onda, quero criar, posso ser útil, me ajuda que te ajudo a mudar o que você quiser. Não tento, mas quero. Só mais um dia esperando chegar aquela bendita dor de prazer pós-orgasmo pra satisfazer minhas superfícies. Não sou tão profundo. Não sou tão aparente. Te deixo entrar a qualquer hora, desde que não me faça suplicar por um ato imediato inacabado. Sou um feto. Só mais um dia pra nascer. Não vou ser criança, vou ser mero objeto ilusório, vou ser atraente e simpático, prometo ficar de olhos fechados. Mais um dia e você vai ver. Chega de sacanagem. Corrompidos somos todos nós, não me faz olhar pro mundo de uma maneira que não queira voltar atrás. De olhos abertos, agora, me ajuda a enxergar o que não vejo de dia, me faz entrar por um túnel de problemas pra sair com a cara limpa num pôr-do-sol estimulante. Me estimula! Preciso parar de entrar em contato com qualquer coisa que não deseja me ver. Me deixa viver. Deixa eu viver você, ele, ela, nós. Só mais um dia e eu vou entender tudo que eu sempre quis decifrar, mas que nunca cheguei nem perto. Vou ver o que acontece quando acordo às oito da manhã esperando pelo fim da noite. Mais um dia. Um só. Não vai machucar. Espera comigo.

*não gosto muito desse, mas quis dar uma atualizada enquanto não acabo um que tá ficando bom. beijos.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

É Crédito

- Eu não costumo vir assim, em cartomantes, mas eu senti que precisava de ajuda. Tudo bem, eu posso seguir meus instintos, ou me suicidar, ou consultar meus pais, amigos, fazer contatos, tentar uma carreira profissional que me dê segurança, encontrar um amor que preencha minhas noites de insônia. Mas eu nem sei se quero isso, sabe? O problema é esse, eu nem sei o que quero de verdade. Já tentei psicólogo, psiquiatra, conselhos, não adiantou. Será que essas coisas místicas funcionam mesmo? Eu nunca acreditei, mas eu ando tão desesperado que já tô apelando a isso, sei lá, vocês andam com esses panos enrolados na cabeça e passam o dia atirando umas cartas ou conchinhas na mesa, você me garante que traz resultado? Que tipo de garantia? Olha que eu não tenho muito dinheiro, não viria aqui se não sentisse que fosse muito necessário, sabe, tem muita gente por aí só querendo se aproveitar do nosso oh-my-god-não-sei-o-que-fazer. Então, esse é o problema mesmo, já disse, não sei o que fazer. Passo os dias coçando o saco dentro de casa, na esperança de que alguém me ligue falando que ganhei uma bolsa de estudos na França ou que um anônimo depositou setecentos mil na minha conta, assim, de presente. Mas faz um tempo que espero e nada disso acontece. O que eu faço, senhora-das-cartas? Você consegue fazer baixar, sei lá, o santo da felicidade em mim, ou fazer com que tudo dê certo a partir de agora? Porque eu sinto que nunca deu. As pessoas pensam que deu, mas nada deu. Tudo bem que eu tive quase tudo que queria, mas isso não foi suficiente, isso não me preencheu por dentro de uma maneira que eu pudesse me sentir completo, feliz, parte de tudo. Eu sei que todo mundo quer isso, mas eu me sinto diferente, eu vejo as pessoas por aí saltitando porque conseguiram um emprego escravo dentro de um escritório, e pra mim isso não faz sentido algum, quero mais, mas sei que quando atingir esse mais vou querer mais e aí já viu, não vou ser feliz nunca. Você trabalha como, exatamente, faz macumba ou o quê? Tenho um pouco de medo disso pra falar a verdade, não quero prejudicar ninguém, não quero que a senhora faça vudu ou jogue umas pipocas na esquina pra alguém se machucar. Eu só quero é mandar embora essa insatisfação, esse desconforto constante, a senhora trabalha com tele-transporte? Porque daí eu ia querer ser mandado pra longe, recomeçar, me descobrir, ser autêntico por fora também. Olha, um gato preto, não dá azar né? Ah, é de estimação, tá bom, quase que chutei ele, uma vez eu tive um gato, mas não era preto, era mesclado. Só que daí foi meu padrasto que chutou pra fora de casa, né, dizia que era alégico a pêlos e essas coisas. Dizem que preto dá azar e de azar já tô cheio, ontem minha chave quebrou e eu fiquei trancado do lado de fora do apartamento, assim, no corredor, sozinho, com frio. Desculpa, a senhora vê o que aí? Sorte no amor, mas me mostra onde você vê isso? Pensei que isso aí fosse parte da decoração, é uma daquelas bolas de cristal, é? Interessante, pergunta aí pra bola o quê eu faço pra me livrar dessa, como que eu saio desse labirinto angustiante em que tô preso desde que nasci, pergunta? Como assim vou ter três filhos com uma mulher ruiva, eu sou gay, minha senhora, ho-mos-se-xu-al, se é que você me entende, não gosto de embarrigar mulher, não. Ok, te perdôo, todo mundo erra de vez em quando, só que eu já errei demais, às vezes penso que nunca acertei, e essa minha falta de esperança me diz que nunca vou acertar. Seus filhos costumam brincar com esses bonequinhos, ah, desculpa, são santos, amém, oxalá, inxalá, não sei como se diz. É, meu pai e minha mãe são separados , isso você acertou, mas é que na verdade eu já tinha dito que tinha padrasto, então era meio óbvio, não? Desculpa, não quis ofender, claro que acredito na bola sagrada. Você pode pedir tele-entrega de comida pela bola? Não, é só curiosidade, pensei que funcionava que nem telefone, Internet, essas coisas. Ok, já terminou a sessão, mas a senhora nem me disse nada, tudo bem, eu nunca acreditei nessas coisas mesmo. Trinta? Você aceita cartão? Pode ser crédito? Vê se não vai ver minha senha na bola, tá bom? Ótimo, então, o prazer é todo seu.

*adoro rotina com correria. e que bom que a chuva ta parando! beijos.

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Não quero anjos

Por mais que soubesse que faltava alguma coisa por ali, ela não pensou duas vezes antes de partir. Decidiu ouvir as vozes serenas de sua consciência e se mandar de uma vez por todas. O que lhe faltava era impulso, mas não mais, agora ela podia se orgulhar da enorme atitude que tomaria. Querendo ou não, era algo pra se guardar. Na melhor das hipóteses, alguém acharia seu corpo estendido completamente naquele chão imundo e chamaria a polícia. Quem culpariam? Ela tinha decidido: era vítima e assassina. Ela queria pegar suas roupas e jogar pela janela, mas desistiu porque talvez alguém pudesse querer guardar de recordação. Não, não, ninguém ia querer. Só uns trapinhos baratos dessas lojinhas que todo mundo compra no crediário. Ela decidiu não fazer falta pro mundo, decidiu não ser mais um pedaço de obstáculo nas manobras que os outros faziam. Deixa eu ser assim, pensava, completamente invisível, me deixa desaparecer no meio dessa escuridão fascinante que você ainda não pôde experimentar. Ora, não se fala dessas coisas com ninguém, só em pensamento, então ela não pediu opinião, decidiu sozinha, e pela primeira vez tomou uma decisão cem por cento sua. Só não me atiro porque tenho medo de altura. Seria mais emocionante, mas daí todo esforço necessário pra conseguir esse revólver ia pro ralo. Ela decidiu não ter mais que pensar, não ter que sorrir quando está chorando por dentro, não ter mais que trabalhar desgastantes quarenta horas por semana pra conseguir pagar a conta do supermercado. Ele queria um apartamento grande e bem localizado, e eu que tive que me virar pra pagar, agora que se dane, vai morar com a mamãe ou arranja outra puta pra pagar tuas dívidas. Babaca, quero ver quem vai lavar as cuecas imundas. Aposto que vai fingir derramar umas lágrimas só pra não ficar chato pros parentes. Babaca. Eu ainda agüentei por três anos. Babaca... Babaca. Babaca! Como que eu engatilho isso aqui? Devia vir com manual. Não é todo mundo que tem um brinquedinho desses em casa. O cara da arma disse que tinha que colocar as balas, apertar alguma coisa, mirar e pá. Seria esperar até o chumbo penetrar sua carne fria pra então ir direto pro paraíso. Ou pro inferno. Dizem que o paraíso é sem graça, não tem droga nem putaria, quero é ir pro inferno que com certeza é mais parecido com esse mundo aqui. Me jogo no colo do capeta e não penso duas vezes antes de ser livre em qualquer lugar que seja notada. Ela tirou suas roupas até ficar completamente nua, olhou-se no espelho e observou pela última vez seus peitos caídos e as estrias no quadril. Quero ir embora logo. Mas não é assim, falta coragem. Não, eu tenho atitude, atitude, mulher. Se pudesse eu nasceria de novo, mas o mundo só tende a piorar, foi uma boa escolha não ter filhos. Já me consumi por dentro de todas as maneiras possíveis, já me refiz em cada pedaço de dor. Não quero mais ser vítima, quero matar, tenho sede do meu próprio sangue e sede de vingar uma alma não vivida. Por muito tempo fui só um corpo jogado por aí, implorando pelo perdão de tudo que não tinha feito. Agora me vou. Quem vai no meu enterro? Não me interessa. Não quero ser o foco de um evento mórbido cheio de gente se lamuriando por não ter me dado mais valor. Mesmo assim serei o foco, finalmente, vou estar em cima de um caixão de madeira vagabunda pago em dez vezes sem juros praquela imobiliária oportunista. Não vou deixar herança nenhuma, bebi até o último centavo pra não contribuir com mais nenhuma aventura daquele otário. Ele não pensaria em mim. Eu penso nele, mas com raiva. Um ódio mortal que me faz querer espremer todo resto de vida que corre pelas minhas veias. Sou assassina. Meto uma bala pra que não metam mais nada pra dentro de mim. Ninguém mais vai me encostar. Sou minha própria assassina. Não faço questão de relembrar nada, já vivi muita coisa imprestável em todos esses anos. Já perdi as esperanças de ter um futuro digno misturado com espasmos felizes. Sou nada. Nem quero ser alguma coisa. Só quero ser coisa alguma. Não. Não sei. Deixa eu ter meus devaneios. Um epitáfio contraditório, o que escreverão na minha lápide? Uma alma que não pensou duas vezes antes de nos deixar sofrendo. O caralho. Pensei mais, pensei sete, oito, trinta e três vezes antes de comprar essa coisa aqui. Sofrendo nada, vai ser alívio, sofrimento só vai vir junto com as contas que eu costumava pagar sozinha. Sozinha. Me sinto sozinha, inútil, fútil, desse jeito todo despejada por aí. E se eu desistir? Não da vida, da morte. Não. Quero ser eterna, mas agora. Já. Não. O que eu quero, afinal? Quero esperar mais uma depressão caótica? Não. Não sou eterna. Sim. Será que lá é pior? Não. Sim. Sim... Mais uma vez. Vou tentar. Não. Sim. Não.
Ela apontou a arma pro peito, suspirou pela suposta última vez e aguardou anjos que nunca vieram. Ela não soube disparar, força, destino, não sei. Ela não soube. Ela queria ficar. Não queria, mas devia. Chorou. Saiu do lugar, foi pra casa e fez as malas. Ia pro norte. Pegou o primeiro ônibus, chorou. Conheceu um empresário, apaixonou, casou, ele morreu, ela herdou. Enriqueceu. Teve tudo que queria. Mas não foi feliz. Percebeu que isso não era pra ela, nem pra qualquer um, ser feliz é coisa de gente escolhida a dedo, concluiu. E decidiu partir. E partiu. E conseguiu tudo o que sempre quis: ser coisa alguma.

*cansado e energizado, em dúvida, feliz e triste. não sei também. que venha o futuro, destino ou seja lá que nome dão pra tudo o que vêm pela frente. beijos e um final de semana cheio de espasmos felizes.

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Clã

Não passo um segundo sem me perguntar a origem de toda essa coisa interior. Os versos, as ameaças, as angústias, os medos, as visões paralelas, tudo me sufoca a ponto de querer recomeçar uma vida não entendida. Quero partir do princípio de que nada existe e que eu sou apenas um cadáver rodeado de mistérios inacabáveis. Participo de um clã de pessoas que entendem o mundo de uma maneira não-confortável. Vigio cada artifício inexperiente que me faz ser uma ameaça à dignidade humana. Me faço entender que quero mais do que todas essas coisas tolas que as pessoas costumam buscar, dirijo uma sinceridade por uma longa estrada de ingratidões. Não sei, não faço, não quero. Vou buscar o sagrado segredo secreto de todas as razões da minha própria existência.

*nao sei, nao sei.

quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Tele-bafo

- Oi, eu queria pedir uma pizza. Só que ainda não sei os sabores. Pode me falar do que vocês têm? Hm, na Internet, olha, eu tô sem Internet aqui, sabe, meu pai ficou me enchendo por causa das despesas, daí tive que tirar. Não vou poder ver então. Não, não, não tenho a mínima idéia do que quero, acho muito difícil ficar escolhendo sabor de pizza, sei lá, se pedir o sabor certo, beleza, mas o problema é que eu posso me arrepender da escolha, daí vou passar a noite num super mau-humor vagabundo, desculpa a palavra, às vezes eu não me seguro, sabe, manias, gírias, esse jeito de falar que as pessoas do meu círculo social têm, isso fica impregnado na gente, consome nossas palavras boas e quando a gente percebe, tá falando um monte de besteiras e nome feio. Ah, desculpa, a pizza, claro, acho que vou querer quatro queijos e milho, não, sem bacon, só milho mesmo, gosto assim, como assim, sem bacon não dá? Poutz, logo agora que tinha me decidido, tá, então quatro queijos e siciliana, ótimo, me diz uma coisa, a cebola é bem cortada, né, ou é assim, em rodelas grandes? Ai, droga, prefiro ela bem picada, não pode quebrar meu galho, por favor, meu namorado me deixou, meus pais já não suportam mais pagar minhas contas, eu tô desempregada, difamada, executada, queria só uma porção calórica pra me deixar feliz numa noite triste dessas e tu ainda vem me dizer que a cebola não pode ser bem picada e que o corn não vem sem o bacon? Mas que porra de pizzaria é essa, hein, caralho? Droga, nunca mais ligo pra essa porcaria de estabelecimento de vocês, bando de empregado filho-da-puta, vai se foder você, otário, só queria uma merda de pizza pra fazer meu corpo esquecer da dor, saco, vocês têm que estragar minha noite, né, minha mãe já tinha me dito, esse povo da capital é tudo mal educado mesmo, se não fosse o interior pra salvar a dignidade, esse país tava na merda, não que não esteja, mas estaria afundado mais ainda, não, peraí, não desliga não, desculpa, eu só me exaltei, não queria te ofender, droga, me escuta, pô, eu só... tutututututu. Eu só queria falar com alguém.

*é ficção, sou educado, ok? beijos.

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Café-da-manhã

Não vou te pedir pra ficar por mais uma noite, não insisto, já que insistir é coisa de desesperado, eu prefiro ficar mergulhado na solidão a ter que te implorar para que consuma mais um pedaço de mim. Não vou te ligar depois, pra garantir vou te apagar de todas as agendas telefônicas, do meu celular, do meu computador, da minha existência. Eu sei que você não quer, isso a gente nota. Sei que foi pura consumação de prazer, sei que não existe mais nada que eu possa te oferecer, a não ser entretenimento de uma só noite. Não sou perfeito, nem você, nem nossa relação imaginária que se desfaz a cada contorno de suspiro executado, não foi minha culpa, eu sei, nem sua, foi culpa do mundo, sei lá, do governo, do capitalismo, do socialismo, do panaca que atendeu a gente no supermercado. Mau-humor nada, é sentimento, é falta, é vazio interno que precisa ser preenchido de qualquer forma, qualquer não, mas de alguma forma, intensa, com força e carinho. É, o álcool costuma fazer isso, deixa as pessoas mais bonitas, desejadas, transforma qualquer indivíduo em um pedaço de carne exposto no mais vagabundo dos açougues, mas eu te digo, não sou um pedaço de carne, sou mais que isso. Não sei o que sou, se soubesse te diria, não quero te obrigar a ficar aqui sem saber o que fazer, não quero que você se embriague mais uma vez pra poder me encarar de verdade, de fato, me assume, não tiro pedaço, não corto você em pedaços pra depois digerir nas minhas fantasias e era-só-isso. Vai lá pensar na vida, já que não sou sua vida, eu até queria ser, mas não desse jeito, não, já deixei muito babaca de boca aberta com meu desempenho nas situações, não só sexuais, eu sei que tu não pensa em outra coisa, mas não, eu me saio bem em qualquer sopro de vida que tenha que engolir. Te ajudaria, te trataria com carinho, te mostraria o lado bom de não se sentir só, o lado bom do desabandono, quero me entrelaçar a ti, unir nossas vontades e fazer disso um só propósito. Não quero não, desisto, tu merece ficar sozinho e eu também, não quero namorado só pra dizer que tenho, só pra exibir pros amigos como uma peça de roupa nova que acabei de comprar no shopping mais caro dessa cidade amena. Não vou te considerar como objeto, já que tu é gente, carne, não de açougue, é carne humana recheada de carências e incompreensões. Não vou me machucar, prometo, tu não merece, eu não mereço, ninguém merece nada, vou colocar uma calça e sair pra correr, preciso de endorfina, anfetamina, serotonina, cafeína, ritalina, venlafaxina, fluoxetina, preciso me curar dentro de uma embalagem metálica que eu posso comprar em qualquer farmácia. Foi bom pra ti? Pra mim foi. Me liga qualquer dia, tá. Se eu estiver sozinha podemos repetir a dose. Prometo me curar desse exagero e daí podemos, quem sabe, nos entender de verdade.

*independência o caralho.

domingo, 6 de setembro de 2009

Desaniversário

Será que me esqueceram? Será que ninguém vem? Eu sabia que não devia ter marcado nada, eu devia passar meu aniversário dormindo, esperando essas malditas vinte e quatro horas acabarem depressa pra que possamos voltar a um dos trezentos e sessenta e quatro dias de desaniversário, como dizia o chapeleiro, onde eu não seja o foco central de congratulações obrigatórias e três tapinhas nas costas de, ficando velho, hein. Não espero que ninguém venha mesmo. Hoje o dia é meu, então, o que mais mereço é ficar na minha mais solitária e divina companhia. Mas eu convidei. Deviam ao menos mandar uma mensagem dizendo, sei lá, tenho outras coisas pra fazer, opa, preciso fazer sexo e não poderei ir, estou escalando uma montanha na África, hoje é dia de novela, ou qualquer baboseira que sirva como desculpa não-sincera e que me faça entrar num estado de conforto-alívio. Já se passaram treze minutos da hora marcada, dez é até tolerável, mas treze, alguém podia ser pontual ao menos hoje, é sábado, o trânsito nem tá tão horrível assim, o tempo tá bom, tá quente, perfeito pra beber e comer ao som de um rockzinho anos 80. E eu esperei tanto, preparei tudo, até comprei chapeuzinhos pra relembrar os tempos de infância, talvez tenha sido exagero, não sei, mas foi de boa intenção. Vinte e dois anos na cara, dois patinhos na lagoa, esperava que alguém dissesse, mas nem essa triste piada sem graça eu ouvi. Daqui a oito anos tu vai fazer trinta, o tempo passa rápido, hein, me lembro como se fosse hoje o dia em que ainda pegava ele no colo. Porra, nem os parentes? Nem mamãe? E eu pensava que ela me amava. Devo ser adotado, isso sim. Se não, já teriam chegado. Quanto preconceito com adotados! Talvez essa ausência seja um sinal pra eu me atirar da janela do quinto andar, aposto que no enterro todos iriam. Vinte minutos. Exageraram. Vou fazer cara de bravo quando aparecer alguém, tirar satisfação, onde já se viu, deixar o aniversariante sozinho, coisa de gente irresponsável. Será que tem bebida suficiente? Podem ter imaginado, ih, vai faltar bebida, nem vou. De certo foi isso, vou ligar pra tele-entrega e pedir mais, olha, tão me ligando, o quê, descer pro teu apartamento, tá passando mau, já vou, quer que chame ambulância, tá, to indo rápido. Mais essa, meu melhor amigo passando mau, tem que puxar o foco justo hoje, que seria um dia só meu, my special day, porra, eu nem devia ter nascido. Vou deixar a porta encostada, caso chegue alguém nesse meio tempo, vou de escada que o elevador vai demorar, ai, quase torci o pé, toc toc toc, sou eu, abre aí.
- Surpreeesa!

*tô indo pra um aniversário. mas não é surpresa. uma vez fizeram uma festa surpresa pra mim, mas eu não curti. na verdade, eu nunca gostei muito do dia do meu aniversário... beijos.

sábado, 5 de setembro de 2009

Destí.

Ela caminhava em direção à sua casa, caminhava depois de um dia longo e louco de trabalho escravo na mais perfeita solidão. Escritoriozinho sem janela é foda. Passar oito horas por dia teclando naquele computador velho que ela precisa suportar. Doutor Rank já dizia, a gente precisa viver. Viver o quê, de quê, porquê? Ela não sabe, nem eu, nem ninguém. Enquanto isso, ela caminha, até onde puder chegar, onde conseguir chegar sem ser abordada por panacas que precisam tirar as coisas dos outros. Afinal, isso também é trabalho. Pra eles, não pra todo mundo. Já pensou se todo mundo resolvesse sair por aí tirando tudo que é dos outros? Ideal seria andar armado com um bastão pra dar bem no meio da cara de qualquer interrupção a caminho de casa. Uma vez pararam ela pra pedir informação, onde fica a rua tal, e ela naquele mau-humor próprio de pré-menstruação, ela querendo esganar qualquer pescoço que pudesse servir de desabafo pra sua raiva de cotidiano, de mesmice, de fazer-sempre-a-mesma-coisa. Vai pro inferno, disse ela, pra onde eu vou te mandar e pra onde eu vou junto quando conseguir sair daqui. Mais um dia daqueles. Daqueles que tem sido cada vez com mais freqüência, daqueles que todo mundo tenta escapar pra não gerar um suicídio coletivo. Enfim, ela caminhava, ou tentava caminhar, com tranqüilidade, mas a mente dela era invadida por todo e qualquer tipo de pensamento que ficava triturando seus neurônios ao invés de trabalhar eles de maneira a criar algo construtivo ou uma solução pra todos-os-problemas-da-vida-medíocre. Uma noite preta, escura, nublada, gelada, solitária, suspeita. Seus passos ecoavam por entre os prédios e os estabelecimentos fechados da meia-noite. Ela só pensava, mais duas quadras e chego em casa, tiro toda a roupa e me atiro no sofá, fumo qualquer cigarro, abro uma cerveja barata e relaxo e me recompenso por ter tido outro dia imperfeito. Entro no MSN e fico no aparecer offline pra que minha barra não encha de caras querendo me comer por conta de papinhos “o q vai fazer no findi?”. Vou te mandar pra puta-que-o-pariu, asshole. Ela não precisava dar satisfação pra ninguém, ainda era quarta-feira, não sabia o que fazer no final de semana, mas não queria ir cantar no videokê de um barzinho sujo com péssima companhia. Preferia ficar na dela, assistir a algum filme da lista dos 100+ da Bravo! ou ir pra algum lugar alternativo encher a cara e reclamar de sua vida pro primeiro cara de All Star que encontrasse. O pior é que All Star agora tá na moda, pensou ela, qualquer um usa. Então alugo o primeiro cara que não começar o papo com algo do tipo “você era a mais linda entre todas da pista”. Quero é coisa boa, papo que renda, que me faça refletir sobre tudo que eu acreditei a vida inteira e que, naquele momento, percebo que é mentira. Quero é tomar cerveja de graça, quero ir pra um apartamento com pôsteres dos filmes do Wim Wenders e falar coisas sem sentindo enquanto transo loucamente com um desconhecido. Ela não precisava disso tudo, precisava só de um pouco de amor, de afeto, era carente assumida e queria só compartilhar a carência com alguém. Nem precisava ser em bar, em noite, podia conhecer na Internet mesmo, não, não, hoje em dia é tudo fake, precisava conhecer alguém por intermédio de alguém, daí dá pra confiar mais. Uma quadra e ela chegaria em casa. Só mais uma. Só mais um obstáculo diante dela. E vieram. Dois homens vieram, encostaram nela por trás, ela tremeu, eles apalparam. Ela se desvencilhou, tentou reagir, tentou colocar toda a sua raiva pra fora. Mas foi em vão, porque eles tinham uma vantagem: arma. Dois tiros no peito e um na cabeça. Uma bolsa roubada e um corpo atirado na calçada. O fim de todas as coisas que pretendia fazer no resto de sua vida, o fim de todas as reclamações que viraram rotina em sua vidinha podre. Agora era ela, ali, de verdade, esperando só mais uma atitude de qualquer coisa pra ir parar no inferno. Deixa ela. Ela sempre quis partir. Só mais um suspiro e o fim de tudo. Sem lamentações. Era a vez dela fugir. E fugiu. Sozinha, ela conquistou o lugar que achava merecer. Merecer. Foi assim que ela entendeu tudo que jamais tinha compreendido. E chegou onde sempre quis estar. Ponto.

Hang Out-Over

Hoje não tô nem pra leitura. Hoje, não presto pra nada. Ninguém me atende, eu não me atendo, não me entendo, sei lá. Hoje eu tô por não existir. Por ficar invisível, calado, surdo, em posição fetal em baixo de algum pedaço de pano que me separe de todo o resto. Hoje não quero ver filme, cansei, não quero sair, nem beber, nem me acabar, nem falar coisas sem sentido pra pessoas que nunca vou ver de novo. Quero só ficar aqui, quero que o tempo congele, e descongele, que ele passe ou não passe por cima de mim. Não quero filosofia barata, não quero fazer a social, nem sorrir praquele bando de gente que eu nem gosto. Ou gosto. Às vezes sim. Chega de cigarros, minha garganta ta cheia de catarro, minha barriga encheu de tanta água que tomei, sinto frio, calor, sono, tédio, vontade de meter os dedos com força no teclado uihewfnuileauhuhkhmikxhfhgekjhekufh. Pobre teclado. Hoje não tô pra piedade, nem de máquina, nem de gente. Nem de mim, nem do tempo, nem do espaço, nem dos desejos, nem da porra da dor de cabeça. Sem querer parecer estúpido, não tô nem pra ti. Nem pra ninguém. Triiim.
- Oi. Tá afim de ir beber uma cerveja? – 7 segundos de silêncio – Tá aí? Vamos beber umazinha?
- Tá, vou colocar uma calça e já passo aí. Beijos.
Todos os dias.

*Nem todos. Tô bem!
Hoje não tô nem pra leitura. Hoje, não presto pra nada. Ninguém me atende, eu não me atendo, não me entendo, sei lá. Hoje eu tô por não existir. Por ficar invisível, calado, surdo, em posição fetal em baixo de algum pedaço de pano que me separe de todo o resto. Hoje não quero ver filme, cansei, não quero sair, nem beber, nem me acabar, nem falar coisas sem sentido pra pessoas que nunca vou ver de novo. Quero só ficar aqui, quero que o tempo congele, e descongele, que ele passe ou não passe por cima de mim. Não quero filosofia barata, não quero fazer a social, nem sorrir praquele bando de gente que eu nem gosto. Ou gosto. Às vezes sim. Chega de cigarros, minha garganta ta cheia de catarro, minha barriga encheu de tanta água que tomei, sinto frio, calor, sono, tédio, vontade de meter os dedos com força no teclado uihewfnuileauhuhkhmikxhfhgekjhekufh. Pobre teclado. Hoje não tô pra piedade, nem de máquina, nem de gente. Nem de mim, nem do tempo, nem do espaço, nem dos desejos, nem da porra da dor de cabeça. Sem querer parecer estúpido, não tô nem pra ti. Nem pra ninguém. Triiim.
- Oi. Tá afim de ir beber uma cerveja? – 7 segundos de silêncio – Tá aí? Vamos beber umazinha?
- Tá, vou colocar uma calça e já passo aí. Beijos.
Todos os dias.

*Nem todos. Tô bem!
**Faz um tempão que escrevi isso, nem lembro quando foi. Mas achei bonitinho e resolvi publicar.

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Torpedo

A mulher sentia suas pernas tremerem, sua barriga suar frio por dentro e a cabeça girando. Não sabia o que era aquele sentimento, mas sabia que algo estava por vir. Um sentimento, talvez, de sei-lá-o-que misturado com qualquer-coisa. A gente nem sempre consegue explicar o que sente por dentro. Mas ela sabia, sabia que algo ia acontecer. Algo pra sempre, sabe. Que muda a vida da gente e que depois a gente pensa, pô, como valeu a pena mudar assim, de repente. Tão depressa. Mudanças são sempre bem-vindas praqueles que não sabem o que são de fato. Eu nunca soube. E a mulher nem sabia. Não sabia de nada. Aliás, será que alguém, nesse mundo todinho, sabe de alguma coisa de fato? A gente nasce, cresce, morre, e depois se pergunta: porque eu nunca fui patinar na Groelândia? É, um animal nem sempre pode ter um rabo, é o que mamãe dizia. Mas voltando à mulher que tremia, ela continuava tremendo, claro, até que deu um pulo, o celular vibrando no bolso esquerdo da calça jeans vagabunda. Era mensagem, mensagem. Ela esperava uma mensagem. O cara disse no dia, vocês serão avisados por mensagem. Eles já tinham o resultado então, e ali estava ele, ali estava a resposta final. O resto de sua vida dependia do processo de clicar-abrir-mensagem e ler, ler o que ela nem sabia o que era, mas que ao mesmo tempo sabia, ia mudar, mudaria sua vida. Certo, for sure, camarada. Era essa a sua hora, o momento em que ela era a mestre, no mundo todo, ela que comandava aquele momento, porque aquele momento podia mudar sua vida. Ela foi clicar, mas pensou, pode não ser nada, pode ser mensagem daquela merda de operadora. Vai acabar com o seu momento, com a magia, com a ansiedade. Foda-se. Ou não. Não, não, não vou abrir agora, afinal, eles iam ligar, mandar mensagem é meio informal demais. Ta, vou abrir, ela pensou. Nos 2 segundos em que seu dedão ia em direção àquele maldito botão-que-ia-mudar-o-rumo-de-sua-vida-ou-não, ela pensou na mãe, no pai, na infância, nos beijos adolescentes, nas dúvidas da vida pré-adulta, pensou no porque pensava tudo com hífen, pensou na roupa que deixou pra lavar, pensou no dia em que perdeu a chance de conhecer o amor da vida dela, pensou nos pacotes de bolacha que devorou nas madrugadas de insônia, nos cigarros fumados pelos bares da cidade, nas mancadas que deu com pessoas importantes, no seu dedo pai-de-todos, porra de hífen, satisfazendo seus desejos e substituindo o toque de um homem. Apesar de tudo, ela foi feliz. Mesmo que sua vida mude, ou não, ela aproveitou e errou e acertou e amou e fez tudo que alguém normal faz hoje em dia. Ponto. Clique. Agora. Você não passou na seleção de trabalho na Argentina. Ponto. Clique. Putz. Merda. Porra. Vida inútil. Afogar as mágoas. Arruma o cabelo e sai. Noite de novo. Beijos e tchau. Continuo na mesma. Mudanças, por enquanto, não. Ok. Nem sempre é nosso dia. Amanha tento de novo.
E, estranhamente, foi nessa noitada, que conheceu o amor de sua vida. Quarenta e cinco anos de casados, até que ele morreu de parada cardíaca. Ela, de velhice. Nada mudou, mas tudo foi diferente.

*será que alguém lê isso aqui? ou pior, será que algué gosta? hehe. beijos pra mim, então.

quarta-feira, 2 de setembro de 2009

Descontínuo

Ontem tinha grupo de estudos na faculdade, uma espécie de aula pra debater cinema e tentar aprender algo que não te ensinam normalmente. Sempre tem convidado, filme, conversa, desconforto. Quase dormi. Mas tomei um estimulante e encarei. Foi só começar a discussão que já surgiu uma velhinha de óculos meio “I surf” querendo meter um monte de bobagens na cabeça da galera. Porra, se liga. Ela era daquele tipo que acha que idade é sinônimo de conhecimento, que só porque viu a Coca ser inventada acha que sabe mais que todo mundo. Daí ela começa e não deixa ninguém falar, expõe as opiniões dela como se fossem algo supremo da inteligência humana. Bullshit. No mínimo deve ter lido um artigo em alguma revista, decorou umas linhas e já quis dar lição de moral. O foda é que ainda teima em falar difícil, colocando palavras de mais de quatorze letras só pra fingir que sabe de alguma coisa. Sabe nada. Quer é causar. Tudo bem, não vou culpar ela, deve ser difícil ficar velho e ver que ninguém tá nem aí pra te ouvir. Que tu só fala do passado, que o futuro não é como os tempos de antigamente. Enfim, saí da aula e vi que ela foi direto continuar a conversa com o convidado, coitado, deve ter agüentado mais duas horas de falação em torno do assunto. Não tinha mais nada pra fazer e resolvi ir pra casa, mas não antes de passar no supermercado e comprar umas cervejas, já fazia três dias que não bebia nada. Cheguei lá, peguei uma cestinha verde e saí pra passear por aqueles corredores cheios de bobagens e falsas necessidades que eu adoro. Mas não comprei nada disso. Não por falta de vontade, por falta de dinheiro mesmo. Escolhi cinco latões da cerveja em promoção, peguei umas barrinhas de cereal pague três leve quatro pra fingir que faço dieta, olhei o preço dos pacotes de papel higiênico e fui embora. Aliás, no ano passado eu fiquei juntando rolos de papel higiênico pra fazer algo de útil, sei lá, pensei que poderia criar uma arte moderna unindo uns trinta num fio de nylon e pendurando na minha parede. Que nada, ficou uma merda, eu até tinha gostado, mas ninguém gostou, daí resolvi colocar fora e acendi um cigarro pra comemorar meu desapego a eles. Porra, foram vários meses juntando. Mas enfim, eu preciso parar de juntar lixo no apartamento achando que posso criar algo genial que vai me garantir o próximo prêmio Nobel da genialidade. Ao menos não juntei sofás velhos, teria ocupado mais espaço. O que eu tava falando mesmo, ah, sim, da velhinha. Não, já foi, acho que tava contando que saí do supermercado, fui pra casa e abri uma cerveja. Ah, líquido dionisíaco. Cerveja e cigarros e solidão e computador e chuva batendo de leve na janela. Quase um orgasmo. Fiquei ali, só aproveitando aquele momento de ócio, que é quase uma terapia pra mim quando eu não tô num dia bom. Não que eu não estava, ontem até que acordei de bom-humor. Quer dizer, não acordei de bom-humor, adquiri ele ao longo do primeiro café-com-cigarro do dia, já que sonhei que tinha assassinado uma pessoa e me senti culpado demais. E no sonho, ou pesadelo, minha mãe tentou esconder a arma que eu tinha usado pra matar em baixo da cômoda do quarto dela, só que depois descobri que não era ela que tinha escondido lá e que ela não sabia de nada, e de repente eu tava brincando de esconde-esconde com uns amigos em uma espécie de labirinto urbano. E daí acordei todo assustado, me sentindo culpado por ter matado alguém só pra levar o coração da pessoa pra aula de biologia. Coisa de sonho. Eu nem tenho mais aula de biologia! Tá, vou te dizer a verdade, isso tudo não aconteceu ontem, aconteceu hoje, e tá acontecendo, cheguei agora desse tal grupo de estudos e tô bebendo a cerveja que comprei no super. Só tomei duas, mas já comecei a mudar de assunto e a escrever umas coisas nada a ver. Mas fingi ser ontem porque eu pretendo publicar o texto amanhã, ou hoje, porque vão ler amanhã mas amanhã vai ser hoje amanhã. Enfim, preciso parar de escrever pra tirar um quinze de sono e recomeçar a vidinha logo depois disso. Obrigado por ter perdido seu valioso tempo comigo. Beijos.

*Na última noite também dei uma sonambulada e derrubei o ventilador no chão. Tsc tsc.

terça-feira, 1 de setembro de 2009

Guerra

Tento me encontrar em meio a todo caos que está ao meu redor. Tento encontrar meu significado mais profundo, as minhas verdades, os meus conflitos, pra depois misturar todos e beber o resto da minha essência. Quero enfrentar a minha guerra interior, batalhar pra que não haja mais sufoco perante meus suspiros. Sou o princípio da luz querendo iluminar aquilo que não brilha por conta própria. Envio meus sentimentos por correio pra depois ver chegar uma resposta que não vem. Já não sei mais o que é querer por conta própria, já não sei o que é sentir por dentro sem tentar omitir por fora. Diante disso, escrevo minhas próprias linhas tortas em torno de toda a existência que eu não consigo mais decifrar. Me vejo dentro de um jardim de pétalas jogadas ao chão como se fossem uma coisa suja. Eu estou sujo. Tento me lavar de toda sujeira que está impregnada nas minhas palavras de desabafo. O meu erro de não saber mais por onde começar se foi, o meu erro agora é não saber onde toda a loucura vai acabar. Desejo não ser, para que não possa mais fazer das minhas vontades um jato de esperança morna. Se foi tudo mera ilusão existencial, então agora corro pra conseguir alcançar tudo o que já está perdido dentro de mim.